segunda-feira, 29 de novembro de 2010

perder a cabeça

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"Fiz em 1914 meu primeiro busto de observação. Era meu irmão que posava. Meu pai era pintor. Eu tinha visto a reprodução de pequenos bustos sobre uma base e imediatamente tive vontade de fazer igual. Meu pai me comprou plastilina, e comecei. De início, senti um prazer extremo e tive a impressão de que a coisa viria bem facilmente, de que eu conseguiria fazer mais ou menos o que via -- ainda tenho o pequeno busto em casa. Cinquenta anos depois, é curioso confessar que, há dois dias, estou tentando fazer a cabeça daquela época, como em 1914, mais ou menos da mesma dimensão que a primeira, e enquanto em 1914 eu tinha a impressão de fazer o que queria, agora não consigo mais.

Será que é psicológico? Não sei. Mas, desde então, nunca mais consegui fazer uma cabeça simplesmente como a vejo, no sentido mais primário. Se vejo uma cabeça de muito longe, tenho a ideia de uma esfera. Se vejo bem de perto, ela deixa de ser uma esfera para se tornar uma complicação extrema em profundidade. A gente entra no indivíduo. Tudo parece transparente, a gente vê através do esqueleto.

A impossibilidade principal é apreender o conjunto e o que se poderia chamar detalhes. Assim, só penso nos olhos. [...] Sim, para esculpir bastaria essencialmente esculpir os olhos. [...] Tenho a impressão de que se conseguisse copiar só um pouquinho -- aproximadamente -- um olho, eu teria a cabeça inteira. [...] Não penso diretamente no olhar, mas na forma do olho. Se eu aprendesse a forma do olho, isso daria provavelmente algo que se assemelharia ao olhar! Sim, toda a arte consiste talvez em conseguir situar a pupila. O olhar é feito pelo que está em torno do olho. Mas a dificuldade para expressar realmente esse "detalhe" é a mesma que para traduzir, para compreender o conjunto. Se olho você de frente, esqueço o perfil. Se olho o perfil, esqueço a face. Tudo se torna descontínuo. Não consigo mais apreender o conjunto. Estágios demais. Níveis demais. O ser humano se torna complexo. E nessa medida não consigo mais apreendê-lo."


Giacometti, numa entrevista de 1962

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