quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

foie gras

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Acerca do tema da próxima edição da Granta, BETRAYAL, uma breve história com patos.

"I got the feeling, quack, that we’ve seized the castle, quack-quack, that the banging of pans is ours, that we’re in more than we’ve ever been, that this one at the kitchen, knife in his hand, quack, he’s gonna help us, yes, that these onions and tomatoes, quack-quack, all of that, is our plan working out."

("Tenho a impressão, quén, de que tomamos o castelo, quén-quén, que o bater panelas é nosso, que a gente está mais dentro do que nunca, que aquele ali na cozinha, de faca na mão, quén, vai nos ajudar, vai sim, que essas cebolas e tomates, quén-quén, isso tudo é o nosso plano dando certo").
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quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

creperia, calçadão e discoteca

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Alan Pauls sobre Eric Rohmer e a praia (trecho de A vida descalço):

"Não é o sul, não é o Mediterrâneo, não são as orlas chiques que aparecem nos filmes de Rohmer (e quando aparecem, como Biarritz em O raio verde, aparecem planas, sem brilho nem sedução), e sim as praias comuns da Normandia ou da Bretanha, tão impessoais, tão carentes de cor local e de glamour quanto uma colônia de férias do sindicato geral de adolescentes. As histórias se passam no verão, mas o tempo nem sempre ajuda: os impávidos céus azul-celeste são a exceção, não a regra, e os veranistas rohmerianos devem se contentar amiúde com o duvidoso encanto das manhãs ventosas, a nebulosidade tenaz e um sol metálico que enfeia cruelmente os corpos e obriga a seduzir ou a ser seduzido entrecerrando os olhos. No entanto, nunca o cinema de Rohmer parece tocar tanto o coração do desejo como quando se instala nesses balneários de meia tigela, que preferem a funcionalidade do banal a qualquer forma de beleza natural. Antes de seus atrativos visuais, Rohmer escolhe a praia porque seu sistema, altamente dependente da meteorologia, ao mesmo tempo regular (estações, ciclos, biorritmos, fases naturais: mais de uma vez o cineasta declarou que o único roteiro que usou em O raio verde foram as tábuas de marés) e caprichoso (imprevistos, variáveis difíceis de controlar, acontecimentos excepcionais), parece reproduzir numa escala atmosférica o jogo de mecânica e acaso, maquiavelismo construtivo e aleatoriedade, que ocupa o centro da arte rohmeriana. A praia, além do mais, é o território das férias, do ócio, da disponibilidade: estados de potência frágeis e ao mesmo tempo promissores que prolongam e preparam os pequenos grandes incidentes (encontros, coincidências, encadeamentos, equívocos) de que são feitas as histórias de Rohmer. Mas principalmente porque a praia é o espaço hipercondutor por excelência, e, portanto, o tipo de território ideal para que o desejo, força nunca conforme, sempre distraída, desdobre toda sua mobilidade e descreva suas trajetórias mais caprichosas. Segundo o idioma rohmeriano, a praia só é permeável ao erotismo na medida em que impede que o desejo se fixe numa posição sedentária e o condena a não ceder, a seguir sempre adiante, a peregrinar sem descanso. Assim, reduzida a uma espécie de princípio conceitual, a praia aparece como esvaziada, puro espaço de circulação onde nascem os ímpetos eróticos e os marivaudages do coração que depois terão lugar em outra parte. Porque “a praia”, segundo Rohmer, é basicamente essa “outra parte”: não a areia, nem o mar, nem os guarda-sóis, e sim os passeios adjacentes, os bares, os calçadões, as creperias, as discotecas, os quartos de hotel, as casas de veraneio. Quando Rohmer a surpreende tomando sol na praia de Dinard, o bronzeado de Margot, a protagonista de Conto de verão, passa quase despercebido. É só ao vê-la atendendo à mesa de Gaspard na creperia onde trabalha, ou caminhando a seu lado entre árvores, ou empreendendo uma excursão ao refúgio de um velho marinheiro — ou seja: naqueles momentos em que a marca que a praia deixou nela reaparece num contexto heterogêneo —, que notamos a cor que suas faces adquiriram, esse rubor tênue, mas paulatino, que se intensifica à medida que o filme avança (Rohmer costuma filmar suas ficções estivais em ordem cronológica, do princípio ao fim), em que se confundem a influência do sol e a excitação, a natureza e o pudor, e que termina por torná-la desejável. Ao contrário, a praia, contexto forte, introduz tamanho contraste com a vida que as percepções da identidade podem se alterar: no dia seguinte, depois de ter comido na creperia onde Margot o atendeu, Gaspard topa com ela na praia, mas não a reconhece; é ela quem o interpela e o faz lembrar que se conheceram. Além de postular uma sutil defasagem social — os clientes nunca se lembram dos garçons; os garçons sempre dos clientes —, a cena descreve bem o efeito de vida dupla que a praia institui: vestidos não somos os mesmos que de maiô, e quem nos vir entrando no mar provavelmente não nos reconhecerá à noite tomando sorvete na calçada ou dançando na discoteca."
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terça-feira, 8 de janeiro de 2013

vida descalço

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Caraíva, novembro 2012
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